Profissão de Fé.
Quem costuma ler meus textos no blog ou me conhece
pessoalmente sabe que sou um militante da causa do livro.
Gosto de me definir como um Mercador de Livros, tenho este
oficio há mais de 30 anos, portanto é natural que eu queira proteger o mercado
que me ajudou a conquistar tudo que possuo. Faze-lo sempre e a cada dia mais
forte, é uma obsessão.
Ao mesmo tempo, tenho a responsabilidade de olhar para as
oportunidades e ameaças que surgem de maneira analítica, controlando minha
emoção para que aqueles que esperam de minhas observações as orientações que
possam ajudá-los a se posicionar frente a
estas situações, sejam de fato favorecidos pela minha argumentação, isolando o
que desejo, daquilo que percebo que as tendências induzem a acontecer.
Um fim , um começo.
Quando li no PublishNews o artigo do Seth Godin intitulado “Um Fim Para os Livros”, as primeiras linhas me inspiraram a rejeita-lo totalmente,
classificando-o apenas como mais um texto messiânico de quem procura ganhar mais visibilidade
para vender palestras mundo afora, prática muito em voga por ai, inclusive.
Mas lendo com mais frieza o texto do autor americano,
isolando o título marqueteiro, boa parte das coisas que ele expõe são fatos
muito específicos do mercado do seu país, é normal que americanos achem que o
mundo gire em torno do seu umbigo, o que não é normal é que aceitemos.
Quando ele diz “a LIVRARIA, como conhecemos, está condenada porque
muitos desses estabelecimentos vão passar da condição de ganhar um pouco
dinheiro a cada dia, para a de perder um pouco diariamente” reforça o que o livreiro
brasileiro já sabe muito bem.
Só vender livros não sustenta uma empresa comercial, o mix de
produtos deve contemplar itens de maior valor unitário, maior giro e melhor
margem, caso contrário é morte certa. Mas isso tem muito pouco a ver com o crescimento
das vendas dos e-books. É intrínseco ao negócio.
Por Dentro dos Números.
A expansão das vendas dos e-books no mundo se deu ao mesmo
tempo em que a crise econômica varreu as economias dos países do chamado
primeiro mundo, portanto é natural que os livros digitais com preços irrisórios usados para conquistar mercado, crescessem de forma exponencial.
Por exemplo em UK, no momento
estabilizou em torno de 21,7% do número
de exemplares vendidos e em pouco mais de 10,3% em dinheiro neste mercado,
conforme dados da pesquisa “Understanding
The e-Book Consumer Today” realizada pela Nielsen daquele país em abril deste
ano. Coincide inclusive com correções nas políticas de precificação, com a
Amazon majorando seus preços.
Outra fato muito importante, muitas vezes as matérias se referem somente ao percentual de exemplares, lembrando que que o sustenta as empresas é $ !
Quando olhamos os números da Associaton Of AmericanPublishers (AAP) relativas ao primeiro trimestre de 2013 não é possível nem de
longe imaginar este mundo sem livrarias e livros “tal como conhecemos” proposto
pelo artigo, nem muito menos o domínio dos livros digitais sobre o livro
impresso.
Depois de registrar crescimentos de 252% no mesmo período em 2010, caiu para 159%
em 2011 , 28% em 2012 e agora APENAS 5% em 2013. Por acaso isso é um
comportamento de sobreposição e extermínio de um mercado de mais de 500 anos?
Não acho!
Mais significativo ainda são os números relativo às vendas
de livros nas diferentes encadernações. Ah, sim o mercado americano registra
uma queda de quase 5% tendo no segmento de Young Adults uma redução de quase
25% frente ao ano anterior, a responsabilidade maior por esta queda. Bem provavelmente
pela falta de uma novidade representativa que cobrisse o grande volume da série
Crepúsculo
para o público adolescente.
Enquanto isso no Brasil...
Em breve teremos números com esta mesma qualidade aqui no Brasil,
agora que a Nielsen está lançando o Bookscan e ai sim poderemos dizer com toda a
propriedade que o Brasil ainda tem muito mercado para consumir LIVROS e aqui me
valho da colocação do Ruy Castro que diz que é um absurdo que tenhamos que
falar “livros impressos”, como se este produto com mais de 500 anos de
história, tivesse se tornado um ente menor frente ao seu “oponente” tecnológico.
Preço Fixo do Livro.
É preciso lembrar que os dois países citados, onde houve uma
expansão muito grande do mercado digital nestes últimos anos, não possuem leis
que controlem os preços de livros, o que faz com que as grandes redes de
livrarias e principalmente o E-commerce, pratiquem preços muito agressivo e que
tem levado as pequenas livrarias a sucumbirem frente à concorrência tão
desigual. Considero esta situação ainda pior, considerando que o Livro para
estas empresas Ponto Com é usado apenas para atrair tráfego de consumidores
qualificados, vendendo livros às vezes ao preço de custo.
Sempre tive opinião
contrária à Lei do Preço Fixo para o livro, mas diante do que ocorre no Reino
Unido e nos Estados Unidos, acho fundamental que este ponto seja colocado
novamente na mesa de forma contundente.
Estou dizendo isso apenas porque quero proteger o mercado
que me ajuda a pagar as contas?
Não, porque livrarias regionais, pequenas e
médias tem papel central na formação cultural e intelectual das populações onde
se situam, permitir que a lógica do mercantilismo se fortaleza é apoiar a
destruição da cultura do país. Acredito que o livro digital vem ajudar a democratização do
acesso ao Livro e à Leitura, mas não como um elemento que se sobrepõe rompendo
com o mercado estabelecido, mas criando facilidades para atingir locais menos
assistidos, que provavelmente nunca teriam
condições de sustentar uma livraria.
Convivência tranquila.
Digo isso enquanto vejo minha filha de 12 anos dormindo no
sofá com um livro do Percy Jacson com as páginas abertas aonde parou a leitura antes de pegar no sono
e minha caçula de 4 anos “lê” no iPad, pela enésima vez, o app do livro “Quem
Soltou o Pum?”
É nesta convivência que acredito assim como acredito que alguma
hora os profetas do fim do livro vão ter que arranjar outro assunto para vender
palestras. Talvez lançando mais livros que serão vendidos "fisicamente" em nossas livrarias tradicionais.
2 comentários:
Gerson, conforme já lhe falei este é o melhor artigo já postado que eu gostei, gostei tanto, que eu gostaria de ter escrito. Continue a escrever bons artigos como este. Parabéns. Manoel Paim - Livreiro/AC
Ótimo artigo, Gerson. Minha monografia trata exatamente desta não transição impresso/digital e a coexistência de ambos, com produtos para todos os públicos e seus perfis!
Parabéns! É realmente muito bom fazer parte deste mercado que leva cultura e reflexão para todos!
Abraços
Carmen
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